sexta-feira, 24 de junho de 2016

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA OITO

O DESENVOLVIMENTO ERÓTICO HUMANO
Texto de Rafael Rocha. Jornalista, poeta e editor-geral deste Humanitas

Na história humana, algumas práticas e costumes sexuais são vistas como libertinagem, erotismo e pornografia. A hipocrisia social é grande demais pra suavizar esses termos e diferenciar conceitos.
São muitas as dificuldades para definir o erótico e a obscenidade corporal. Um e outro são coisas complexas e possuem circunscrição em qualquer vivência social.
No fim do Século XIX a palavra libertinagem era basicamente um adjetivo e significava desregramentos dos costumes e dos hábitos, bem como a ação daqueles que não gostam de ficar sujeitos às leis da religião.
Para os libertinos os desejos são insaciáveis logo que se tornam realidade, o que foge do contexto de igualdade com o erótico.
O termo pornografia foi utilizado em livro pela primeira vez no ano de 1899, quando Cândido de Figueiredo o dicionarizou, sendo empregado para dissertar sobre as pinturas que retratavam temas obscenos.
Erotismo é um termo derivado de Eros, deus grego do amor (Cupido na mitologia romana) e nunca teve a carga negativa das palavras derivadas de pornô.
No campo da indústria cultural nunca será pacífica a fronteira entre erotismo e a pornografia quando sabemos que se costuma definir cenas eróticas em sexo explícito e não explícito. Critério enganoso: se o erótico pode ser explícito, nem sempre o pornográfico o é. Na verdade, o que é erótico para uma pessoa pode ser – e frequentemente é – pornográfico para outra.
Vivemos uma época social ávida por sexo e imaginamos épocas passadas quando o sexo era marginalizado de maneira hipócrita. É um fato concreto dizer que, hoje, gozar tornou-se algo a ser realizado com intensidade.
O cristianismo conseguiu fazer com que as mulheres entre os séculos XVII a XIX fossem vistas como seres traiçoeiros. Bastava utilizar o exemplo de Eva, na Bíblia, por ter comido o fruto proibido. E mais ainda: por não conseguirem adentrar os mistérios da fisiologia feminina como menstruação e outras secreções corporais.
Seguindo um caminho mais rápido, vemos que o adultério era prática comum no Século XIX e os exemplos vinham das camadas mais altas, mas em tese era restrito aos homens porque as mulheres casadas, sempre submissas, esperavam o retorno dos maridos em casa. Isso, porém, não impedia que algumas – em conluio com amigas e empregados alcoviteiros – também cometessem adultério.
Os homens só tinham relações sexuais com a esposa para terem descendentes. O prazer era buscado com a outra”. Isso alcançou o apogeu no século XIX o chamado “século da hipocrisia”. Nessa época, surgiram no Brasil, as casas de prostituição, novidade importada da Europa.
Os primeiros nus no teatro, filmes e revistas eróticas surgiram no início do século XX, até culminar com o biquíni sempre a ficar cada vez mais curto e com a revolução sexual nas décadas de 1960 e 1970.
Erotismo e pornografia estiveram presentes em figuras desenhadas por artistas homens e mulheres durante os séculos aqui assinalados. A sociedade hipócrita, vitimada por leis religiosas arcaicas e cheias de preconceito não as apresentavam como elas hoje são apresentadas em filmes, nas TVs e em revistas.
Ao longo do tempo ocorreram mudanças na forma de sentir e ver a sexualidade e a noção de intimidade ambas influenciadas por questões econômicas, políticas e sociais. A mulher hoje já se expõe de corpo malhado em academias de ginástica e vestindo roupas sensuais.
Cada vez mais as mulheres estão conscientes do real poder feminino, utilizando a liberdade de expressão e direitos.
Mulheres comuns estão exibindo a nudez e participando de ensaios de fotos sensuais para presentear maridos ou namorados. A liberdade sexual alcançada nas últimas décadas incentiva todas elas a assumirem a sensualidade, sem constrangimentos.

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA SETE

CULTURA DO ESTUPRO CONDENA AS MULHERES AO MEDO

Camila Moraes – Jornalista/SP


A garota carioca cujas imagens de agressão sexual foram compartilhadas na Internet no fim do mês de maio de 2016 recebeu solidariedade nas redes sociais, mas não só isso. Perfis falsos dela foram criados com postagens a realçar seu suposto mal comportamento” como circunstâncias e atenuantes que tornam quase inevitável” o desfecho trágico.
Enquanto as investigações do que ocorreu estão em curso, especialistas alertam que a prática não é isolada. Faz parte da cultura do estupro que faz com que as mulheres agredidas se sintam culpadas e deixem de denunciar os crimes, o que contribui para que os responsáveis por atos violentos permaneçam impunes.
O problema não é trivial porque, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, é um dos fatores para a alta a taxa de subnotificação do estupro. A entidade estima que apenas 30% a 35% dos casos são registrados. Contabilizando só os episódios denunciados, o crime acontece a cada 11 minutos no Brasil.
O Fórum realizou, no ano passado, em parceria com o Datafolha, pesquisa em que 90% das mulheres e 42% dos homens diziam temer uma agressão sexual. No Rio de Janeiro – que agora investiga o caso da jovem de 16 anos graças ao fato dele ter sido compartilhado em redes sociais – cerca de 4 mil casos aconteceram no último ano, e quase a metade deles foi com meninas menores de 13 anos, segundo um estudo da secretaria de segurança do Estado, o Dossiê Mulher.
Em 2009, a lei 12.015 do Código Penal Brasileiro foi alterada e passou a considerar, além da conjunção carnal, atos libidinosos como crime de estupro.
Circunscrever um crime de estupro é um processo frequentemente degradante para a mulher.
Em 2015, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que dificulta o acesso ao atendimento médico de vítimas de estupro.
O PL 5069 de 2013, exige que, para serem atendidas, as vítimas de estupro terão que passar primeiro por uma delegacia.
Depois, deverão fazer um exame de corpo de delito para, só então, seguirem para o hospital, com os devidos documentos que comprovem que elas, de fato, foram estupradas.
Para ser válido, o projeto ainda precisa ser votado no Plenário da Câmara.
Contra essa realidade, as mulheres brasileiras saíram as ruas no ano passado, em diversos protestos pelo país que “disseram basta” e ficaram conhecidos como a Primavera Feminista.
O termo cultura do estupro deriva de “rap culture” e que foi cunhado por feministas nos EUA na década de 1970.
Dela faz parte a culpabilização por parte da sociedade das vítimas – mulheres que fazem por merecer”  os ataques que sofrem usando roupas curtas e decotadas, andando em más companhias” e consumindo bebidas em festas que não deveriam frequentar  se fossem moças de família”.
Ao jornal “O Globo”, a defensora pública Arlanza Rebello lembrou, citando Jair Bolsonaro (PSC) que até os políticos brasileiros reproduzem o discurso de que muitas mulheres pediram para serem estupradas: É um contexto muito sério de conservadorismo e banalização”.
O presidente da Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil no Rio de Janeiro, afirmou ao jornal que meninos acabam cometendo o crime por saberem que outros o praticaram impunemente, por uma questão de autoafirmação’.
E a socióloga Andréia Soares Pinto, coordenadora do Dossiê Mulher, fez um apelo à sociedade durante a entrevista que concedeu ao canal Globonews:
“É preciso encorajar as mulheres a reduzir a subnotificação dos casos de estupro. Esses números nos ajudam a fazer pressão e nos permitem argumentar em prol de políticas públicas para combater o problema”.

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA SEIS

UNIÃO POLIAFETIVA: NOVA REVOLUÇÃO HUMANA
Juarez Pedrossiano Goitá  - Fortaleza/CE

Valores exclusivistas estatais ignoram a realidade da vida amorosa de muitas pessoas que têm mais de um relacionamento. Essas pessoas são obrigadas a esconder da sociedade a união poliafetiva como se fossem criminosas. No entanto, muitos desses “criminosos” são mais felizes que os de famílias tradicionais monogâmicas.
O Estado brasileiro ainda vive enorme atraso no que se refere ao Código Civil. Basta que perguntemos o porquê da bigamia ser considerada um crime e o adultério desde a lei n°11.106/05, não ser mais assim considerado.
Os tempos mudam! As pessoas mudam. Já não seria hora de despenalizar a bigamia, assim como foi feito com o adultério?
Aqueles que conseguem se relacionar afetivamente com mais de uma pessoa e construir uma família deveriam ser exemplos para a sociedade, na medida em que, muitas vezes se sacrificam para manterem um lar, a despeito dos preconceitos que enfrentam.
Devemos considerar que nos tempos atuais qualquer forma de amor é válida, desde que seja para o aprimoramento da  felicidade conjugal e familiar. O amor verdadeiro não deveria ter limites com regras pré-estabelecidas em leis ou contratos.
Até que ponto o Estado pode legislar restringindo a formação de novos núcleos familiares da forma como são formados na atualidade, sem restringir o número ou o sexo de seus componentes, e sem discriminar outras formas de família que podem surgir com a evolução da sociedade?
Pode mesmo o Estado impedir que pessoas convivam em união familiar e adquiram direitos decorrentes dessa convivência, só por desejarem formar uma família diferente da tradicional?
Algumas pessoas já revolucionam essa área, no Brasil, com relacionamentos poliafetivos duradouros. Na cidade de Tupã, interior de São Paulo, um homem e duas mulheres registraram a união poliafetiva em cartório, através de uma Escritura Pública.
A tabeliã Cláudia do Nascimento Domingues afirmou que a declaração foi uma forma de garantir direitos familiares aos três e ainda assinalou que a Constituição não permite poligamia no Brasil, mas como os três são solteiros e vivem juntos por vontade própria, protocolou o documento.
Novo rumo para a vida em comum? O tempo é que dirá, mas as mudanças humanas no seio de uma sociedade arcaica já estão começando a tomar forma e a trazer novos pensamentos revolucionários no âmbito do relacionamento.
A vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFam), Maria Berenice Dias, explica que a união poliafetiva é mais uma das diversas formas atuais de família. Segundo ela, o “novo conceito de família é mais flexível, não há necessidade de casamento”.
Mais: a oficialização da união garante direitos, principalmente no caso de separação e responsabilidades sobre os filhos.
Três pessoas que vivem um relacionamento amoroso atípico afirmaram que isso realmente “dá certo” e que são felizes. Klinger, Paula e Angélica, do Mato Grosso, e que vivem no estado de São Paulo.
Klinger e Paula foram morar juntos e depois de algum tempo unidos, Paula conheceu Angélica pela internet e a incluiu na relação após certo período de envolvimento. Hoje nenhum deles deseja fugir do relacionamento.
No Rio de Janeiro, Leandro Jonattan da Silva Sampaio, 33 anos, Thais Souza de Oliveira, e Yasmin Nepomuceno da Cruz, ambas de 21, é outro exemplo de união poliafetiva. A paixão uniu o trio e a história de três anos de namoro deu como resultado uma união estável, a primeira na cidade, registrada no 15º Ofício de Notas.
O Direito e a Justiça deveriam acompanhar a evolução dos costumes da sociedade e fazer o papel que lhes é próprio, ou seja, regulamentar, através de leis, o maior número possível de situações fáticas e, principalmente, aquelas que foram esquecidas pelo legislador.

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA CINCO

O TERRORISMO CRISTÃO NO MUNDO (PARTE 8)
Especial para o Humanitas
Pedro Rodrigues Arcanjo - Olinda/PE

Semelhança com o atual fundamentalismo islâmico não
é mera coincidência
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Uma “rica tradição cristã” teve fim no ano de 1826, quando o último herege foi assado vivo pela Inquisição espanhola.
A partir de então, a Igreja Católica vai recorrer a meios mais sutis para matar.
Entre esses meios, ainda hoje vigentes, incluem-se a proibição de assistência às mulheres que fazem aborto, sabotagem do planejamento familiar nos países pobres, proibição de preservativos (camisinhas) como modo de lutar contra a gravidez e a Aids etc.
No ano de 1847, a Suíça é devastada por uma guerra religiosa. Os cantões católicos, cujos governos estão muito influenciados pelos conselheiros jesuítas, fundam uma aliança militar, o Sonderbund, que exige a anexação das regiões majoritariamente protestantes.
Os jesuítas pedem ajuda aos monarcas católicos da Áustria, mas uma vitória rápida das tropas protestantes consegue evitar uma intervenção austríaca, que levaria a um conflito de extensão europeia.
Os protestantes então iniciam uma feroz “caçada aos católicos”, expulsando da Suíça os jesuítas, considerados responsáveis pela guerra.
Em 1848, a população de Roma entra em choque contra o papa e o expulsa da cidade.
Isso durou pouco tempo, pois com a ajuda das tropas francesas enviadas por Luís Napoleão Bonaparte, primeiro presidente da Segunda República francesa e depois Imperador dos Franceses no Segundo Império Francês, o papa retorna ao poder no ano seguinte (1849).
A primeira das “piedosas” ações cristãs após o retorno do pontífice é a de fuzilar os opositores, fazendo com que o Estado da Igreja volte a ser uma monarquia absoluta, tendo o papa como soberano. Nos anos posteriores quem participar de qualquer eleição no estado italiano é classificado como um ser diabólico e excomungado pela “bondosa” Santa Madre Igreja. Isso foi decretado no ano de 1871.
Os cristãos ortodoxos não fazem por menos quando é para impor na cabeça das pessoas uma crença ou apenas aterrorizar. No ano de 1881 começam os “pogroms” russos, sob a incitação dos prelados da Igreja Ortodoxa. Para tomar os bens dos judeus, eles difundem o boato de que o Czar Alexandre II teria sido assassinado por um judeu, fazendo com que multidões se juntem em mais de duzentas cidades russas e destruam o patrimônio e roubem os bens deles.

A ortodoxa Rússia Czarista torna comum os “pogroms”, sobretudo entre os anos de 1908 e 1917. O mais violento ocorreu em Kishinev, em 1913, quando a multidão foi incitada pelos prelados ortodoxos para atacar violentamente os judeus. Durante dois dias são assassinados 45 judeus, mais de 600 ficam feridos e 1.500 casas são saqueadas, na defesa da cristandade ortodoxa.

No ano de 1889, foi erguida e inaugurada, em Roma, no dia 9 de junho, a estátua em homenagem a Giordano Bruno, no Campo di Fiori. Enraivecido, o papa Leão XIII passa o dia inteiro em jejum aos pés da estátua do apóstolo Pedro.

A imprensa católica aproveita a ocasião para atacar essa ação, dizendo que tudo aquilo se tratava de “orgia satânica”. Aproveita e descreve a festa da inauguração, como sendo o triunfo da sinagoga, dos arquibandidos da Maçonaria, dos chefes do liberalismo demagógico, o máximo da ignorância e da malignidade anticlerical”.

Entre os anos de 1918 a 1945, a Igreja Católica Romana entra em compromisso com o fascismo europeu, apoiando ativamente o crescimento do totalitarismo na Europa.
Na Itália, a Igreja firma com o regime fascista uma concordata que faz do catolicismo religião de estado.
Em 1929, Mussolini, depois de ter assinado a concordata dita Patti Lateranensi”, é qualificado pelo papa como “o homem da providência”.
Em 1932, o ditador recebe das mãos do papa a Ordem da Espora de Ouro, a mais alta distinção concedida pelo Estado do Vaticano.
Mas a estátua de Giordano Bruno volta a criar nova tensão. O papa aproveita a concordata para pedir ao amigo ditador que destrua a estátua erguida em 1889.
O ditador, que tem um filho chamado Bruno, toma a defesa do livre-pensador e declara à Câmara dos Deputados que aestátua de Giordano Bruno, melancólica como o destino desse monge, ficará onde ela está. Tenho a impressão que seria se encarniçar contra esse filósofo que, se equivocado e persistiu no erro, no entanto já pagou”. Para mostrar que não se arrepende de nada a Igreja canoniza então Roberto Bellarmino, o acusador de Giordano Bruno, nomeando-o “Doutor da Igreja”.

O TERRORISMO CRISTÃO NO MUNDO (PARTE 7)

Especial para o Humanitas
Pedro Rodrigues Arcanjo-  Olinda/PE

Semelhança com o atual fundamentalismo islâmico não
 é mera coincidência
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O cristianismo (através da Igreja Católica e a sua congênere protestante) usou o “TERROR” para manter as pessoas subjugadas.

Durante mais de mil anos, entre os séculos V e XV, utilizando o terror como sua principal arma, os prelados e dirigentes cristãos (católicos, protestantes e ortodoxos) conseguiram manipular a mente dos seres humanos “(através do medo)” de tal forma, que hoje fica muito difícil para a raça humana desacreditar, já que tudo foi algo imposto em suas mentes através do terror.

Assim, hoje, as pessoas que se dizem cristãs, vão às igrejas católicas, ortodoxas e aos templos protestantes, “crendo que estão a adorar um deus de amor e de piedade”. Na verdade, suas mentes foram manipuladas desde as mais antigas eras pelo medo e pelo idealismo da morte.

O cristianismo idealizou a morte, quase como numa tragicomédia, onde o senhor supremo promete um paraíso que não existe e leva seus seguidores ao fanatismo, crendo num pai que deixa o filho morrer numa cruz e a imaginar que ter é o essencial na vida.

A “fé” é, nada mais e nada menos, que “falta de argumentos” para explicar o inexplicável da existência e também da inexistência de deus e deuses e santos.

 No ano de 1633, por ter duvidado da teoria geocêntrica de Ptolomeu (que, diga-se de passagem, não tinha nada de cristão), o cientista Galileo Galilei é obrigado a se retratar. Caso não fizesse isso, seria levado à câmara de tortura. As obras de Galileo já tinham sido postas no Índex em 1616.

Apesar de ter-se retratado, ele passou o resto de sua vida confinado em sua casa, numa espécie de prisão domiciliar. Sua reputação de grande pensador e de cientista evitou consequências mais graves para sua vida.

No ano de 1992, a sua memória é reabilitada, parcialmente, pelo papa João Paulo II, após uma pequena revisão de todo o processo.

As igrejas (católica e protestante) gostam de levar os seres humanos a crer que não ocorreram guerras religiosas e que todas as guerras têm apenas teor político.
Mas religião é algo muito complicado. Todas as guerras que aconteceram no mundo têm mais conteúdo religioso do que político, apesar de muitos historiadores devidamente manipulados, gostarem de dizer o contrário.
Na guerra dos 30 anos (1618 a 1648), os reis católicos de Habsburgos forçaram a conversão dos seus súditos protestantes da Boêmia, iniciando a maior guerra religiosa que o continente europeu tinha conhecido.
A Reforma Protestante e a invasão turca da Europa Oriental obrigaram os ramos dos Habsburgos a juntarem forças para preservar o estado europeu. Por causa dessa guerra, a população da Alemanha é reduzida à metade e numerosas cidades são devastadas. As igrejas tentaram mostrar que se tratava de um conflito político.
No ano de 1776, em pleno século das luzes, um jovem de 19 anos, o cavalheiro francês Jean-François de La Barre passa “a vinte passos duma procissão católica, sem tirar o chapéu”.
É preso, torturado e, finalmente, depois de ter a sua língua cortada, seu corpo é colocado sobre uma fogueira e queimado junto com um exemplar do Dicionário Filosófico de Voltaire”, diante de uma multidão fanática e entusiasmada.
Immanuel Kant (1724-1804), professor de Filosofia na Universidade de Konigsberg e estrela internacional da filosofia moderna, no ano de 1793, depois da publicação da sua Crítica da Razão Pura”, publica o tomo A religião nos limites da Razão”, onde coloca as doutrinas cristãs à prova do raciocínio e do “imperativo categórico”.
Isso acende a ira dos piedosos reis da Prússia, que empurrados pelos prelados protestantes intervém, obrigando Kant a se retratar em público, sob pena de perder, imediatamente, seu posto de mestre na Universidade de Konigsberg. Como no caso de Galileu, a fama internacional de Kant o salva de consequências mais severas.

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA TRÊS

REFÚGIO POÉTICO

POETA DO MÊS - Valdeci Ferraz, advogado, escritor e poeta. Natural do Recife/PE, onde ainda hoje vive. Militar reformado como coronel PM/CB. Tem um livro publicado Almas Negras (romance) no ano de 2010.
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A Árvore
Francisca Clotilde – Fortaleza/CE

Ao contemplá-la, triste, emurchecida,
Os galhos nus de folhas despojados,
Sem a seiva que outrora tanta vida
Lhe trazia em renovos delicados;

Ao vê-la assim tão só, tão esquecida,
Tendo gozado dias tão folgados,
Ao som dos passarinhos namorados,
Que nela achavam sombra apetecida:

Ai! Sem querer encontro semelhanças
Entre meus sonhos, minhas esperanças
E a mirrada árvore dolente.

Ela perdeu as folhas verdejantes,
Bem como eu as ilusões fragrantes
Que outrora me embalavam docemente.

Amor e medo
Antonio Rangel Bandeira – Recife/PE

És bela, eu velho;
Tens amor, eu tédio.
Que adianta seres 
Bela, se a beleza
É coisa externa que
Não está no coração?
E minha velhice
Não te interessa
Já que, na vida,
Seguimos destinos
Opostos.

Tens amor, bem sei
É próprio da idade,
Que amor é
Tão somente impulso
Da natureza cega,
Para perpetuar
A miséria amarga
De nosso próprio
Infortúnio.
És bela, fui moço,
Tens amor, eu... medo.
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CARTAS DOS LEITORES

Tive em mão pela primeira vez três exemplares do Humanitas dos meses de março, abril e maio de 2016. Confesso que não esperava que um pequeno jornal apresentasse tanta coisa boa e interessante. Espero ver e ler os próximos. Natanael C. Lima – Fortaleza/CE
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Vida longa, Humanitas! Sou um daqueles leitores que esperam ansioso pelo exemplar do mês. Claudionor Silva Rocha – Salvador/BA
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Não sei quem distribui o Humanitas aqui no Rio, mas sempre consigo achar um exemplar na Lapa no começo de cada mês. Carmencita Lins de Albuquerque – Rio de Janeiro/RJ

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PÁGINA DOIS

EDITORIAL
EROTISMO E POLIAMOR

Neste mês de julho, resolvemos pousar os olhos sobre temas um tanto polêmicos na sociedade de ontem e de hoje: o “erotismo” e as “uniões poliafetivas”.
No tocante ao erotismo, esse tema é inquietante desde o Século XVIII, mas as mudanças de rumo socioculturais ocorridas do fim do Século XX até o início deste Século XXI trouxeram novos rumos.
Estamos, na verdade, a viver uma época ávida por sexo. E muitas vezes ficamos desconcertados quando tomamos conhecimento sobre como o sexo era marginalizado de maneira hipócrita em épocas passadas.
O erótico, na verdade, ocupa um espaço muito importante em todas as sociedades, sendo um componente fundamental da vida e do prazer da vida.
Se os hipócritas não têm lugar no cérebro para aceitar o erótico, então não são pessoas normais.
As pessoas normais não desaprovam o erotismo, muito pelo contrário, utilizam e são utilizadas eroticamente em suas vidas comuns.
No outro lado da moeda, temos a união decorrente de dois homens e uma mulher, duas mulheres e um homem, ou seja, a união poliafetiva, também conhecida como relação múltipla, conjunta ou “poliamor”.
São muitas as divergências sobre esse tema polêmico, ainda que já tenham sido feitas lavraturas em cartório legalizando esse tipo de união.
Uma pergunta não quer calar: pode mesmo o Estado impedir que pessoas convivam em união familiar e adquiram direitos decorrentes dessa convivência, só por desejarem formar uma família diferente da tradicional?
Tanto para o erotismo e para a união poliafetiva existem fortes barreiras a serem vencidas.
Sabemos, isso sim, que a energia sexual é a força mais poderosa que o ser humano possui e responsável por toda a vida existente no planeta.
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Ato de fé – Simone de Beauvoir (*)

Desejei ardentemente ser a garota que comunga na missa da manhã e tem uma certeza serena... No entanto, não quero acreditar: “um ato de fé é o ato mais desesperado que existe”.
Quero que meu desespero pelo menos conserve sua lucidez. Não quero mentir para mim mesma.
Era-me mais fácil imaginar um mundo sem criador do que um criador carregado com todas as contradições do mundo.
Para que minha vida me bastasse, precisava dar seu lugar à literatura. Em minha adolescência e minha primeira juventude, minha vocação fora sincera, mas vazia; limitava-me a declarar: “Quero ser uma escritora”.
Tratava-se agora de encontrar o que desejava escrever e ver em que medida o poderia fazer: tratava-se de escrever.
Isso me tomou tempo. Eu jurara a mim mesma, outrora, terminar com vinte e dois anos a grande obra em que diria tudo; e tinha já trinta anos quando iniciei o meu primeiro romance publicado: A Convidada”.
Na minha família e entre minhas amigas de infância, murmurava-se que eu daria em nada. Meu pai agastava-se: Se tem alguma coisa dentro de si, que o ponha para fora”..
Eu não me impacientava.
Tirar do nada e de si mesma um primeiro livro que, custe o que custar, fique em pé, era empresa, bem o sabia, exigente de numerosíssimas experiências, erros, trabalho e tempo, a não ser em virtude de um conjunto excepcional de circunstâncias favoráveis.
Escrever é um ofício, dizia-me, que se aprende escrevendo. Assim mesmo, dez anos é muito e durante esse período rabisquei muito papel. Não creio que minha inexperiência baste para explicar um malogro tão perseverante.
Não era muito mais esperta quando iniciei A Convidada”. Cumpre admitir que encontrei então um assunto” quando antes nada tinha a dizer? Mas há sempre o mundo em derredor. O que significa esse nada? Em que circunstâncias, por que, como as coisas se revelam como devendo serem ditas?
A literatura aparece quando alguma coisa na vida se desregra. Para escrever - bem o mostrou Blanchot no paradoxo de Aytré - a primeira condição está em que a realidade deixe de ser natural; somente então a gente é capaz de vê-la e de mostrá-la.
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(*) Simone de Beauvoir – filósofa existencialista, escritora e ativista política francesa. (1908-1986)

HUMANITAS Nº 49 – JULHO DE 2016 – PRIMEIRA PÁGINA

LIBERDADE DE AÇÃO E PENSAMENTO É O
CAMINHO MAIS CURTO PARA A FOGUEIRA

No ano de 1776, em pleno século das luzes, um jovem de 19 anos, o cavalheiro francês Jean-François de La Barre, passa a vinte passos de uma procissão católica sem tirar o chapéu. É preso, torturado e, finalmente, depois de ter a língua cortada, seu corpo é colocado em uma fogueira e queimado.
Leia nas páginas 4 e 5 o texto do colaborador Pedro Rodrigues Arcanjo
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ERÓTICO HUMANO

Na página 8 o jornalista Rafael Rocha mostra o desenvolvimento erótico humano desde primórdios do Século XVII até os dias de hoje, bem como a hipocrisia da sociedade no que se refere ao sexo e à liberdade sexual das mulheres.
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Na página 6 o escritor Juarez Pedrossiano Goitá fala das atuais uniões poliafetivas e sobre a falta de uma jurisprudência para esses relacionamentos.
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“Cultura do estupro  condena mulheres ao medo” é o tema do texto da jornalista Camila Moraes na página 7.
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 ATO DESESPERADO

A filósofa francesa Simone de Beauvoir salienta na página 2 deste HUMANITAS que um ato de fé é o ato mais desesperado que existe no âmbito da raça humana.